ÁLVARO COSTA DE MATOS: «Tempo Presente» (Artigo 115)
Mais um falhanço estrondoso em empreender reformas e atacar a raiz dos problemas e será mesmo para os braços de Ventura que os portugueses inevitavelmente se virarão. Basta, afinal, que 260.000 eleitores (o equivalente aos votantes no Livre) se mudem da AD para o Chega.
Pedro Norton – “A última oportunidade”, in Público (3 Junho 2025).

26 de Maio
Na Faixa de Gaza, o ataque a uma escola que servia de abrigo provocou, pelo menos, 25 mortos. A semana começou com novo bombardeamento israelita e com o anúncio da demissão do responsável da Nova Fundação Humanitária de Gaza. Esta organização foi criada de raiz e é apoiada pelos EUA. Jake Wood diz não acreditar ser possível cumprir a sua missão “respeitando rigorosamente os princípios humanitários de humanidade, neutralidade, imparcialidade e independência” e saiu. Uns dias depois, António Costa, presidente do Conselho Europeu, avisou que “a autoridade moral de Israel está a desaparecer” e que já não existem justificações de legítima defesa.
28 de Maio
O Conselho de Administração do Santa Maria conhecia os gastos com cirurgias adicionais há seis meses. Os profissionais de saúde que mais lucraram com estas cirurgias foram um médico, dois internos e uma enfermeira. Depois de conhecida a história do médico dermatologista Miguel Alpalhão que facturou mais de 400 mil euros em dez sábados (mais de 51 mil euros num único dia de trabalho em 2024), a administração do hospital decidiu suspender os pagamentos. Estes profissionais, todos juntos, terão recebido cerca de 850 mil euros em apenas dez meses! Depois de conhecido o caso, soube-se que o “abuso” envolve outros profissionais, onde há médicos a ganhar 20 e 30 mil euros por mês, segundo denúncias de gestores hospitalares que falam em falta de mecanismos de controlo interno. A Ordem dos Médicos reconhece mesmo que há comportamentos “não éticos” por parte de alguns profissionais. Assim vai o nosso SNS!
29 de Maio
O Chega confirmou o favoritismo nos círculos externos ao conseguir ultrapassar o PS como a segunda maior bancada do Parlamento. André Ventura é agora o líder da oposição e fez até uma nova noite eleitoral onde prometeu uma mudança tranquila com um aviso à navegação: “Nada será como dantes”. A ascensão de Ventura será imparável, sustentada numa dinâmica mais ampla de crescimento do radicalismo de direita a nível europeu? Ou as “forças moderadas” ainda têm uma (última) oportunidade para refundar o regime? Se assim for, caberá a Montenegro uma boa parte da responsabilidade para travar a deriva de radicalização da sociedade portuguesa.
30 de Maio
Henrique Gouveia e Melo apresentou a sua candidatura; o PSD aprovou o apoio a Luís Marques Mendes. Com notáveis de vários partidos presentes e numa cerimónia pensada ao milímetro pelo antigo mago da comunicação de Sócrates, Gouveia e Melo anunciou que é candidato à Presidência da República. No primeiro discurso, afastou-se de Marcelo, defendeu a estabilidade política sem dizer a palavra e apresentou-se como o líder ideal para as crises. Terá o caminho aberto para Belém? Veremos. “De forma muito entusiástica e convicta”, o Conselho Nacional do PSD deu o seu “esmagador apoio” a Marques Mendes, segundo Hugo Soares. O candidato presidencial foi aprovado com apenas um voto contra e “certamente mais de cem” a favor. Tendo havido uma coligação com o CDS para as legislativas, não se percebe a falta de comparência dos “conservadores” no amparo ao ex-líder dos sociais-democratas!
1 de Junho
É já quase uma tradição na Iniciativa Liberal: os líderes ficam pouco tempo na cadeira e causam surpresa quando se demitem. Depois de João Cotrim Figueiredo, foi agora a vez de Rui Rocha anunciar que está de saída da chefia do partido: apesar do aumento dos votantes e da consequente eleição de mais um deputado, não cumpriu o objectivo de ser suficiente para assegurar uma coligação maioritária com a AD no Governo. Ao contrário do sucedido na saída de Cotrim Figueiredo, a IL não indicou de imediato um sucessor, preferindo abrir um período de reflexão interna. No entanto, nos bastidores, já começam a perfilar-se potenciais candidatos à liderança. A favorita é Mariana Leitão, actual líder da bancada parlamentar e um dos nomes mais mediáticos do partido. Leitão é vista como uma sucessora natural, sobretudo por ter estado sempre ao lado de Rocha e por ter já sido escolhida como candidata presidencial da IL. Outro nome é Mário Amorim Lopes, deputado que se tem destacado pela visibilidade mediática e proximidade à direcção cessante. Apesar de ter menos notoriedade do que Leitão, encaixa bem no perfil de continuidade defendido por Rocha e pela actual liderança. Do lado da oposição interna, Rui Malheiro, do movimento Unidos pelo Liberalismo, poderá avançar. Apesar de ter sido derrotado na última convenção, não exclui a hipótese de concorrer novamente, dando conta de que vai avançar caso tenha “uma base de apoio sólida”. Os liberais foram rápidos na ilação dos seus resultados eleitorais que, não sendo famosos, resistiram ao voto útil e mantiveram a IL como a quarta força política parlamentar.
2 de Junho
Uma megaoperação militar ucraniana destruiu 34% dos bombeiros estratégicos russos. Recebida num misto de estupefacção e insatisfação em Moscovo, apelidada de “brilhante” por Kiev, a missão traduziu-se num duro golpe para as capacidades ofensivas das forças de Putin e, ao mesmo tempo, abalou os serviços secretos do país, incapazes de prever e travar a acção dos homens de Zelensky. Foram 18 meses de planeamento secreto, um conjunto de 117 drones transportados em segredo em caixas de madeira e vários operacionais infiltrados em território russo. A “operação Teia de Aranha” envolveu serviços de inteligência, logística camuflada e o uso de tecnologia e inteligência artificial para causar prejuízos milionários à aviação militar russa, sendo já comparada ao ataque surpresa japonês a Pearl Harbor na II Guerra Mundial. Haverá novo encontro das delegações dos dois países para mais uma ronda de negociações de paz — Trump diz estar pronto para se sentar à mesa com Putin e Zelensky, Erdogan quer ser o mestre de cerimónias e Moscovo já apresentou as suas condições para um cessar-fogo.
3 de Junho
Não são as próximas eleições — antes, ainda há autárquicas —, mas as presidenciais continuam a fazer mexer. Gouveia e Melo deu a sua primeira entrevista e há duas ou três ideias a reter: disse que não quer Ventura na sua campanha, mas que lhe daria posse; defende que os imigrantes não devem ser julgados pela cultura, mas que a imigração tem de ser regulada; não afastará Luís Montenegro, caso venha a ser arguido, mas admite fazê-lo perante um “desenvolvimento extraordinário”; admite usar a bomba atómica no caso de não haver solução (a médio-prazo) após um chumbo de OE e também quando a “reputação” do primeiro-ministro puder comprometer um Governo. Numa frase, mais do que de centro, o almirante tentou ser neutro, assumindo-se como uma espécie de Suíça da política, tentando agradar a todos! Não sei se será uma boa estratégia, mas a entrevista correu-lhe bem.
4 de Junho
Numa curta mensagem gravada e emitida pela TVI, António José Seguro anunciou ser candidato à Presidência da República, porque “o país precisa de mudança e esperança numa vida melhor”. O ex-líder do PS avançou antes de saber se contará com o apoio do seu próprio partido, que está dividido sobre quem apoiar nesta corrida. A elite socialista despreza-o, mas o país precisa de gente séria como Seguro. Quanto ao PS, continua sem reflectir retrospectivamente e sem debater o seu futuro.