União Europeia e a Maratona Perdida
Nos últimos dias, os meios de comunicação, nacionais e internacionais, destacaram algo que em Portugal depressa foi ultrapassado pela crise política, a trajetória e ambição europeia em rearmar-se, ou pelo menos, o princípio da oficialização desta nova fase para a Segurança e Defesa do velho continente.
A trajetória, que adquire uma nova velocidade com o anúncio de Von der Leyen do projeto ReArm Europe, que totaliza c.800 mil milhões de euros em defesa, um valor surpreendente que sustenta o atraso de décadas que a União Europeia assume na dimensão do armamento e da defesa.
Apesar de ambiciosa, a entrada no percurso de uma maratona, já vencida e com o seu pódio ocupado, é um tanto embaraçoso e valida os críticos da insuficiência europeia nesta dimensão, um embaraço que adquire uma dimensão reforçada, pelo facto desta trajetória ser iniciada passados três anos da invasão russa sobre a Ucrânia e da recente suspensão norte-americana do apoio armamentista à Ucrânia.
A métrica global da relevância estatal em armamento e dos respetivos posicionamentos no seu mercado, vê a sua representação nos indicadores do SIPRI (Stockholm International Peace Research Institute), revelando os mais recentes estudos deste instituto um incremento na importação de armas por parte da Europa no período 2020-2024, 2,5x superior ao que se havia registado no período 2016-2020.
O que se pode extrair destes valores? A constante insuficiência e incumprimento europeu das suas ambições e projetos coletivos, especialmente, quando identificamos que 2/3 destas importações foram efetuadas aos Estados Unidos da América.
A insuficiência prende-se com a já conhecida ambição de autonomização europeia, que adquiriu notoriedade aquando da Presidência Francesa do Conselho da União Europeia em 2022 e dos objetivos de avançar no armamento denotados pela Bússola Estratégica, do mesmo ano, que foi acompanhada pela afirmação «Se não agora, então quando?», de Josep Borrell, Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, no período 2019-2024.
A problemática inerente a todo este projeto e processo de rearmar a União Europeia, está evidenciado na afirmação de Borrell, a dimensão temporal disponível para assegurar uma reação a ameaças externas, isto é, o espaço disponível para fortalecer e armar a União Europeia, de forma a ser um adversário capaz entre os seus rivais-diretos, gigantes na dimensão do armamento, é insuficiente.
A União Europeia pecou pelos anos em que negligenciou a dimensão da segurança e defesa, os Estados-Membros, quase na sua totalidade, negligenciaram um mercado lucrativo, tecnologicamente desafiante e estratégico para a soberania das nações europeias.
Hoje as únicas nações europeias que de forma transversal cresceram nos indicadores de exportação de armamento foram: França, Itália, Espanha, Suécia, Noruega e Polónia.
É caso para dizer que as motivações individuais das nações europeias estão a alinhar-se, em função da necessidade, mas que os interesses coletivos, representados nos interesses da União Europeia, não assumem grande inclinação para o êxito.
O êxito concreto do processo de rearmar a Europa, custará a credibilidade e aceitação do projeto europeu, com um provável crescimento do euroceticismo, pela abordagem ponderada para a efetivação – financeira - do programa ReArm Europe, com recurso ao artigo 122º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), que possibilita «o Conselho, sob proposta da Comissão,(…), sob certas condições, conceder ajuda financeira da União ao Estado-Membro em questão», ultrapassando a aprovação no Parlamento Europeu, como ocorreu com fundos de apoio constituídos no período pandémico (SURE).
Esta estratégia, considerada como provável, salientará as discussões e tensões que se elevam – sempre – que a ideia de endividamento coletivo surge, abrindo o precedente a uma crise política e a um atraso – reforçado – nesta trajetória de crescimento coletivo.
A isto, acrescenta-se empréstimos de 150 mil milhões de euros para tentativa de recuperar uma tese interessante, presente no debate europeu desde 2022, os investimentos colaborativos entre membros no setor da defesa e do armamento.
Conseguirá a União Europeia, de forma coletiva, terminar esta maratona? O tempo escasseia e a demora é costumeira…