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ÁLVARO COSTA DE MATOS: «Tempo Presente» (Artigo 114)

_“Sempre que se fala em ´reforma do Estado´, o debate rapidamente se torna ideológico. Como se modernizar fosse sinónimo de privatizar e digitalizar fosse o mesmo que atacar o serviço público. Esta clivagem empobrece a discussão e torna-se vítima de preconceitos partidários. A verdade é que a introdução de tecnologias na Administração Pública não é uma questão ideológica, mas sim uma questão de sobrevivência institucional centrada no cidadão.”

Luís Vidigal – “Para onde caminham as escolhas políticas e as reformas do Estado”, in Diário de Notícias (14 Maio 2025)_

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Foto: Marina Baginha
Foto: Marina Baginha

9 de Maio

Robert Francis Prevost passou de cardeal pouco conhecido a figura central num universo que extravasa os mil milhões de católicos de todo o mundo. Será o menos americano dos cardeais norte-americanos e é o novo Papa. Tem um percurso como missionário na selva peruana, foi professor de matemática, fala fluentemente cinco línguas e tem uma postura discreta. Progressista, reformista moderado capaz de fazer pontes, Prevost adoptou o nome de Leão XIII, o “Papa dos Trabalhadores”. As reacções à escolha do novo Papa foram de entusiasmo generalizado e de grande expectativa em relação ao que pode ser o seu papado. Marcelo Rebelo de Sousa considerou o novo Papa um continuador de Francisco, de quem era “muito próximo”, e alguém com abertura ao mundo. Para a Conferência Episcopal Portuguesa, Leão XIV vai ser um construtor de pontes para a paz e a justiça. Assim seja!

 

12 de Maio

A tinta verde voltou a entrar na campanha. Há um ano, foi Luís Montenegro; agora, foi Rui Rocha. O líder da Iniciativa Liberal estava a discursar num comício em Lisboa quando dois autoproclamados “activistas do clima” subiram ao palco. Rocha cumprimentou-os, falaram por uns segundos e depois os ditos atiraram-lhe um pó verde para cima. A IL anunciou que vai apresentar queixa, mas planeia leiloar o fato agora bicolor. Vários líderes partidários condenaram o ataque e estiveram bem: a defesa da causa climática não se faz com violência ou tentando impedir que um líder político expresse a sua opinião livremente. A democracia não pode funcionar por intimidação dos adversários; a democracia deve ser o confronto de ideias, coisa que não entra na cabecinha dos pseudoambientalistas!

 

15 de Maio

Na Turquia, nas negociações diplomáticas entre a Rússia e a Ucrânia, Kiev enviou uma delegação chefiada pelo seu ministro da Defesa, Rustem Umerov; da Rússia, saiu uma equipa chefiada pelo assessor Vladimir Medinsky. Moscovo disse que podia discutir cedências, Kiev foi mais longe e considerou um cessar-fogo. Os EUA enviaram Marco Rubio, que disse não ter “grandes expectativas” sobre o encontro. Perante o impasse, a frustração norte-americana cresceu e Washington ameaçou desistir da mediação. Será que o possível fingimento de Putin tornou Trump e Zelensky mais próximos? O próximo passo do presidente norte-americano pode ser imprevisível.

 

18 de Maio

Na ressaca das eleições tiro algumas ilações: 1) a reconfiguração do sistema partidário português: com o resultado do Chega, assistimos ao fim do bipartidarismo, passando a ter 3 grandes partidos: PSD, PS e Chega; 2) a “direita” tem o melhor resultado de sempre e dispõe dos dois terços necessários para fazer, sozinha, uma revisão constitucional; 3) a “esquerda” tem uma derrota histórica e humilhante. Esmiuçando: o PS somou o terceiro pior resultado de sempre em legislativas e, com os 4 mandatos dos círculos da emigração por atribuir, o mais provável é perder para o Chega o estatuto de maior partido da oposição. Inimaginável! Pedro Nuno Santos reconheceu o colapso eleitoral e deixa o partido perdido entre o que fazer com a AD. O Bloco de Esquerda teve também uma “grande derrota” e perdeu o seu grupo parlamentar, ficando apenas com um deputado: Mariana Mortágua. Esta, em vez de assumir as responsabilidades pelo pior resultado de sempre do partido (2% e 119.221 votos), prefere “alargar a esquerda e combater a extrema-direita”! O ambiente de festejo foi surrealista. Igualmente surrealista foi a celebração da manutenção de 4 deputados pelo PCP, que não se veio a concretizar: ao final da noite, os comunistas acabariam por eleger apenas 3 deputados. Paulo Raimundo, que esteve bem nos debates, não conseguiu evitar a descida continuada do número de votos e de mandatos do PCP e a conquista de antigos bastiões comunistas pelo Chega. A culpa, disse ele, é do “investimento nos valores reaccionários”. Sobre as suas responsabilidades, nada disse! O PAN lá manteve Inês Sousa Real à tangente e o Livre foi a excepção à regra numa noite de hecatombe para a esquerda: elegeu 6 deputados e passou a ser a quinta força política no Parlamento. Adivinham-se tempos difíceis para estas forças políticas. A Iniciativa Liberal resistiu ao apelo no voto útil e conseguiu mais votos e mais um mandato, passando de 8 para 9 deputados. Mas não atingiu aquele que era o seu principal objectivo nestas eleições: tornar os liberais incontornáveis para qualquer solução governativa à direita. A IL ficou mais forte, mas não tão forte como pretendia Rui Rocha. André Ventura é um dos principais vencedores e a grande surpresa destas legislativas: apesar de um annus horribilis, aumentou a bancada e pode tornar-se líder da oposição, capturando um lugar que sempre foi do PS quando não ganhava eleições. Com ele, veio o tripartidarismo para Portugal. Mas o grande vencedor foi Luis Montenegro, relegitimado para governar: o voto dos portugueses foi uma espécie de devolução da moção de confiança chumbada no Parlamento. A AD teve mais votos, passa de 80 mandatos para pelo menos 89 e soma mais deputados do que toda a esquerda junta! Ao estilo de Cavaco, o líder do PSD pediu às oposições que o “deixem trabalhar”. Em suma: as eleições reforçaram Montenegro, deram um resultado histórico a Ventura e humilharam Pedro Nuno Santos. Foram um verdadeiro “terramoto político”!

 

19 de Maio

Lá fora, outras eleições importantes: a Roménia escolheu a União Europeia em vez de Putin e JD Vance, numa reviravolta do centrista que derrotou a extrema-direita. Nas presidenciais polacas, o candidato apoiado por Tusk venceu com 31% dos votos, mas haverá segunda volta.

 

20 de Maio

Feitas as contas aos resultados eleitorais, os partidos começaram a preparar os passos seguintes e a antecipar jogadas. “Estar à altura da responsabilidade” e “entregar resultados” são as ordens de serviço no Governo de Montenegro II, que terá de lidar com o peso renovado do Chega. Do lado de André Ventura, também se fazem contas às escolhas em cima da mesa, excluindo cheques em branco. E a dar-se algum passo, terá de ser do primeiro-ministro. No Largo do Rato, o leque de opções surge mais estreito. Com Pedro Nuno Santos de saída, os socialistas parecem mais virados para garantir a estabilidade e “desbloquear” a AD, pelo menos no início da legislatura. Isso mesmo é defendido pelo protocandidato Fernando Medina.

 

21 de Maio

Duas horas ao telefone para no fim ficar tudo mais ou menos na mesma. Donald Trump e Vladimir Putin conversaram para discutir as negociações de paz entre a Rússia e a Ucrânia. A conversa terá sido “informativa, franca e muito útil”, na ótica do presidente russo. Já Trump relatou “alguns progressos”, mas avisou que Kiev e Moscovo vão ter de definir as condições de negociação para a paz.

 

22 de Maio

O PCP anunciou uma moção de rejeição ao governo que ainda não se conhece! Paulo Raimundo explicou que a ideia é travar a agenda “reaccionária” da AD, combater as privatizações, defender o SNS e a Segurança Social e mobilizar oposição. Os comunistas continuam mergulhados no PREC e não aprenderam nada com estas eleições.